Jornada de trabalho e leis trabalhistas

Mundo - século XIX 

Situação da classe trabalhadora:

  • Jornadas superiores a 12 horas
  • Falta de direitos trabalhistas
  • Trabalho insalubre
  • Uso do trabalho infantil
A degradação das condições de vida operária, decorrente dos baixos salários, pode ser observada em diferentes bairros das cidades industrializadas do século XIX. A seguir, apresenta-se a descrição das habitações do bairro de St. Giles, em Londres, extraída da obra A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, de Friedrich Engels, publicada em 1845.

"É uma massa desordenada de casas de três ou quatro andares, com ruas estreitas, tortuosas e sujas, onde reina uma agitação tão intensa como aquela que se registra nas principais ruas da cidade – com a diferença de que, em St. Giles, vê-se unicamente pessoas da classe operária. Os mercados são as próprias ruas: cestos de legumes e frutas, todos naturalmente de péssima qualidade e dificilmente comestíveis, complicam o trânsito dos pedestres e enchem o ar de mau cheiro, o mesmo que emana dos açougues. As casas são habitadas dos porões aos desvãos, sujas por dentro e por fora e têm um aspecto tal que ninguém desejaria morar nelas. Mas isso não é nada, se comparado às moradias dos becos e vielas transversais, aonde se chega através de passagens cobertas e onde a sujeira e o barulho superam a imaginação: aqui é difícil encontrar um vidro intacto, as paredes estão em ruínas, os batentes das portas e os caixilhos das janelas estão quebrados ou descolados, as portas – quando as há – são velhas pranchas pregadas umas às outras; mas, nesse bairro de ladrões, as portas são inúteis: nada há para roubara. Por todas as partes, há montes de detritos e cinzas e as águas servidas, diante das portas, formam charcos nauseabundos. Aqui vivem os mais pobres entre os pobres, os trabalhadores mais mal pagos, todos misturados com ladrões, escroques e vítimas da prostituição a maior parte deles são irlandeses, ou seus descendentes [...]" (Frederic Engels [1845], 2008, p. 71). 


Nesse período, observa-se na Inglaterra a formação dos primeiros sindicatos, a organização de greves por melhores condições de trabalho, salários mais justos e a limitação da jornada a dez horas. Paralelamente, ganha força a luta por participação política, impulsionada pelo movimento cartista, cujo principal marco foi a Carta ao Povo de 1838, que apresentava seis pontos de reivindicação com o objetivo central de democratizar o Parlamento britânico e garantir maior representação e acesso da classe trabalhadora ao poder legislativo.

"Em 1838c, uma comissão da Associação Geral dos Operários de Londres (London Working Men’s Association), liderada por William Lovett, elaborou a Carta do Povo, cujos “seis pontos” são: 1) sufrágio universal para todos os homens maiores, mentalmente sadios e não condenados por crime; 2) renovação anual do Parlamento; 3) remuneração para os parlamentares, para que indivíduos sem recursos possam exercer mandatos; 4) eleições por voto secreto, para evitar a corrupção e a intimidação
pela burguesia; 5) colégios eleitorais iguais, para garantir representações equitativas e 6) supressão da exigência (já agora apenas formal) da posse de propriedades fundiárias no valor de trezentas libras como condição para a elegibilidade – isto é, qualquer eleitor pode tornar-se elegível" (Frederic Engels [1845], 2008, p. 262). 


Multidão reunida encontro dos cartistas em Kennington Common - Londres - 1848
Foto de William Kilburn. (Frederic Engels [1845], 2008, p. 42). 

Brasil - Século XIX e início do XX

No Brasil, no início do século XX, as condições de trabalho eram semelhantes às que prevaleceram na Inglaterra nos séculos XVIII e XIX: jornadas superiores a 12 horas, trabalho infantil, ambientes insalubres e ausência de regulamentação trabalhista.

Greve Geral de 1917
Reivindicações:
Redução da jornada de trabalho
Proibição do trabalho infantil
Aumento dos salários

São Paulo – Greve Geral de 1917.
Edgard Leuenroth/IFCH/Unicamp
Fonte: Agência Senado

É possível notar, nos protestos dos operários, bandeiras pretas — símbolo do movimento anarquista. Nesse período, sindicatos anarquistas e socialistas mobilizavam a classe trabalhadora. Das suas lutas surgiram as primeiras leis trabalhistas muitas delas regulamentadas na CLT durante o governo Vargas.

Governo Vargas
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1943, regulamentou:
  • Direito a férias anuais remuneradas com o adicional de 1/3 do salário. 
  • Descanso Semanal Remunerado (DSR): garantia de um dia de folga remunerada por semana. 
  • Proibição do trabalho para menores de 14 anos e do trabalho noturno para menores de 16 
  • Indenização em caso de demissão por justa causa
  • Descanso antes e depois do parto, sem prejuízo do salário e do emprego; A licença maternidade era de 84 dias e tinha que ser paga pelo empregador. Hoje o valor pago pela empresa é reembolsado pelo INSS.

13º salário - Em 1959, o deputado Aarão Steinbruch (PTB-RJ) propôs a criação do 13º salário. A proposta deu origem à Lei nº 4.090, de 1962  que foi sancionada pelo presidente João Goulart. A lei passou a assegurar a todos os trabalhadores o direito à gratificação de fim de ano.

João Goulart e Maria Tereza Goulart durante comício na central do Brasil, no Rio de Janeiro, em 13 de março de 1964. Goulart representava um governo progressista. Este procurou implantar reformas de bases, entre elas: a Reforma Agrária. Goulart foi deposto pelo Golpe Militar de 1964.

FGTS - O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) surgiu em 13 de setembro de 1966, durante o governo do Marechal Castelo Branco, e entrou em vigor a partir do ano seguinte. Ele foi criado pela Lei nº 5.107.

O FGTS uma poupança compulsória aberta pela empresa em nome do trabalhador, que funciona como uma garantia para protegê-lo em caso de demissão sem justa causa. A empresa é obrigada a depositar mensalmente o equivalente a 8% do salário do empregado em uma conta vinculada do trabalhador, administrada pela Caixa Econômica Federal.

Os valores do FGTS pertencem ao trabalhador. Em algumas situações especiais  (doenças graves, financiamento habitacional, saque aniversário etc.) previstas em lei, os recursos podem ser sacados mesmo sem o trabalhador ter deixado o emprego.

Durante a ditadura militar, de 1964-1985, Marechal Castelo Branco foi o primeiro militar a assumir o governo. Castelo Branco faleceu em um acidente aéreo em 1967.

Brasil - transformações

No final dos anos 1970 e início de 1980, o Brasil vive o renascimento do movimento dos trabalhadores que havia sido silenciada pelos militares. Nesse cenário destaca-se:
1978-1980 - Greves do ABC no Estado de SP.
1984 - Greve de Guariba no Estado de SP.
Luta pela redemocratização “Diretas Já".

Conquistas:
Constituição Federal  - CF de 1988
  • Regulamentação do direito de greve e da autonomia sindical.
  • Redução da jornada de trabalho de 48 para 44 horas. Sendo 8 horas diária  (segunda à sexta - preferencialmente)
  • Máximo 2 horas extras a mais por dia. 
  • Maior autonomia e estruturação da atuação do Ministério Público do Trabalho - MPT.
Obs.: a pauta atual do movimento sindical atual é reduzir a jornada de trabalho para 40 horas semanais.  

Brasil anos 1990
  • Avanço das ideias neoliberais
  • Reestruturação produtiva de caráter toyotista.
  • Perda do caráter combativo do sindicato, ao passo que cresce a postura colaborativa para com o patronato.
Mudanças nas leis trabalhistas que afetaram profundamente a vida dos trabalhadores

Lei Federal n. 9.0601/1998  institui o Banco de Horas. Possibilita a extensão da jornada de trabalho em até duas horas sem necessidade de pagar horas extras. As horas acumuladas podem ser compensadas em um outro dia.

Lei Federal n. 10.101/2000. Autoriza o trabalho e a abertura do comércio em geral em domingos e feriados.

Terceirização - Estratégia da empresa transferir parte de suas atividades meio para outra empresa no intuito de ampliar seu foco na atividade principal. 

A terceirização da atividade-meio era regulamentada pela Súmula 331 do TST, de 1993. Em 2017, o presidente Michel Temer sancionou a Lei 13.429, baseada no PL 4.330/1998, de autoria do então deputado Sandro Mabel (PMDB), ampliando a terceirização. Com a nova lei, tanto atividades-meio quanto atividades-fim podem ser terceirizadas. Por exemplo, antes, em uma escola, apenas funções como limpeza e segurança podiam ser terceirizadas; agora, até mesmo professores podem ser contratados por meio da terceirização.


A reforma trabalhista de 2017 foi uma mudança significativa na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) instrumentalizada pela lei № 13.467 de 2017.
  • O negociado pode se sobrepor o legislado nas convenções e acordos trabalhistas
  • Fim da contribuição sindical obrigatória
  • Reafirma a terceirização irrestrita

Proposta de redução da jornada de trablho

Movimento “Vida Além do Trabalho - VAT”
Pede o fim da escala 6 x 1 

Proposta de Emenda Parlamentar PEC – Erika Hilton (PSOL-SP)
Visa eliminar jornada 6 x 1 e reduzir a jornada de trabalho de 44 para 36 horas semanais

Obs.: França – em 1998 iniciou a redução da jornada de trabalho de 39 para 36 horas

Jornada de trabalho 996

O regime de trabalho 996 surgiu na China e consiste em jornadas das 9h da manhã às 9h da noite, seis dias por semana, totalizando 72 horas semanais. Nos EUA e no Brasil, a ampliação da jornada tem levado muitos trabalhadores, especialmente informais que atuam por meio de aplicativos e contratos de adesão, a se aproximarem desse modelo. Essa realidade contribui para a perda da qualidade de vida e o adoecimento causado pelo excesso de trabalho


Bibliografia:
ENGELS, F [1845]. A situação da classe trabalhadora na Inglaterra. São Paulo: Boitempo, 2008.

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